A famigerada lesão de Stener

Leonardo Kurebayashi • September 27, 2023

Lesão de Stener vs Polegar do Esquiador vs Polegar do Gamekeeper

O presente artigo trará informações importantes para compreensão e diferenciação das lesões acima descritas. Apesar de envolverem a mesma estrutura, o ligamento colateral ulnar (LCU) da metacarpofalangeana do polegar, tais lesões possuem características distintas e formas de tratamento diferentes. 


As dúvidas mais frequentes dos pacientes são

  1. Onde está esse ligamento?
  2. Como é feito o diagnóstico?
  3. Se eu não fizer nada, a lesão de Stener vai se resolver sozinha?
  4. Se eu tiver de operar, a recuperação será muito longa?
  5. Após a cirurgia, meu polegar voltará ao normal?
  6. O que será feito na cirurgia da lesão de Stener?


A leitura do presente artigo tem a intenção de responder tais questionamentos e trazer mais informações acerca dessa lesão.


A primeira colocação em relação a este artigo se refere ao epônimo "Lesão de Stener". Ela foi assim denominada em homenagem a um cirurgião suíço chamado Bertil Stener, que descreveu a íntima relação do ligamento colateral ulnar e a aponeurose do músculo adutor do polegar, em 1962 (Lucerna e Rehman, 2023). Na ocasião, Bertil Stener descreveu não somente a anatomia ligamentar mas também descreveu o tratamento para tal lesão. A partir desse dado histórico, podemos começar a discutir essa temida lesão.

Lesão de Stener. Representação esquemática das estruturas anatômicas: M - Metacarpo; FP - Falange proximal; LCU - Ligamento Colateral Ulnar; LCR - Ligamento Colateral Radial.

Lesão de Stener. Representação esquemática das estruturas anatômicas: M - Metacarpo; FP - Falange proximal; LCU - Ligamento Colateral Ulnar; LCR - Ligamento Colateral Radial. Na imagem, desenhei em minha mão a posição das estruturas ósseas e ligamentares envolvidas na lesão. Para não poluir a imagem, não está representada a aponeurose do músculo adutor do polegar.Parágrafo Novo

Lesão aguda do ligamento colateral ulnar ("Polegar do esquiador")


As lesões do ligamento colateral ulnar na metacarpofalangeana do polegar são comuns, principalmente em
atletas que manuseiam bolas ou esquiadores. Entretanto, no Brasil, observamos essa lesão em praticantes de outras modalidades, tais como o ciclismo, futebol, patins, skate e lutas (jiu jitsu e judô). Geralmente, o paciente apresenta uma história de queda durante prática esportiva e, ao apoiar a mão no chão, cai sobre o polegar e o mesmo sofre um trauma com desvio radial / abdução do polegar. Em minha prática clínica, nem sempre o mecanismo de trauma é de alta energia. Por exemplo, pacientes já se apresentaram em meu consultório referindo trauma no polegar ao tentar realizar uma parada de mão ("plantar bananeira") ou mesmo  tentar levantar uma criança.

Representação esquemática de mecanismo de trauma do ligamento colateral ulnar envolvendo queda sobre o polegar e trauma em desvio radial/abdução do polegar.Parágrafo Novo


Em 1953, Moberg e Stener descreveram uma taxa de incidência de lesão do ligamento colateral ulnar 10x maior do que o ligamento colateral radial. O termo "Lesão do esquiador" ou "Polegar do esquiador" se deve ao fato de que o mecanismo de trauma em praticantes de ski pode envolver a queda enquanto a pessoa segura o bastão do ski. Devido à posição do polegar ao segurar o bastão, o polegar é forçado em abdução, levando a lesão do ligamento colateral ulnar e possivelmente outras estruturas, como a cápsula articular dorsal e a placa volar.

Observe a posição do polegar ao segurar o bastão do ski ou mesmo o bastão para caminhada. Quando o paciente cai, o bastão tende a permanecer fixo no chão e o polegar pode ser forçado em abdução abruptamente, causando lesão do ligamento colateral ulnar do polegar, na articulação metacarpofalangeana.Parágrafo Novo

Nesse tipo de lesão, o mais comum é ocorrer a avulsão distal do ligamento colateral ulnar, no seu ponto de inserção na base da falange proximal. Mas as lesões também podem ser intra substanciais ou mesmo em sua origem (no metacarpo).


Os estudos biomecânicos mostram que quando somente um dos ligamentos é lesionado, a falange proximal tende a rodar no sentido palmar (volar) no lado lesionado, com o ligamento oposto intacto servindo como eixo de rotação. Portanto,
ao existir uma lesão do ligamento colateral ulnar, a falange proximal tende a rotacionar em supinação sobre o eixo do ligamento colateral radial intacto. O inverso é verdadeiro, quando há lesão do ligamento colateral radial isolada, a falange proximal tende a pronar em relação ao metacarpo.


Esse conhecimento é fundamental para que o cirurgião compreenda que a lesão causa uma alteração em diversos planos e explica a origem de possíveis complicações pós-operatórias, caso o desvio rotacional não seja corrigido e incongruência articular, predispondo dor pós operatória e degeneração articular (osteoartrose precoce).


Diversos
padrões de fraturas podem estar associados às lesões do ligamento colateral ulnar. Uma fratura avulsão da base ulnar da falange proximal no ponto de inserção do ligamento é o padrão mais comum. Tipicamente, esse fragmento é pequeno e inclui uma pequena quantidade de superfície articular. De acordo com o Green's (8th ed):

"Se o fragmento envolve mais de 10% da superfície articular e está desviado ≥ 2 mm (com incongruência articular), poderá haver indicação de fixação cirúrgica do mesmo".

Radiografia evidenciando avulsão de fragmento articular da base da falange proximal; representação esquemática de uma fratura avulsão do metacarpo e da base da falange proximal.Parágrafo Novo


Entretanto, há uma grande discussão acerca das fraturas avulsões de fragmentos pequenos, minimamente desviados ou não desviados. A maioria dos serviços recomenda imobilização com tala gessada, mas, um artigo publicado por Dinowitz et al. (1997) mostrou que 100% dos pacientes com fraturas avulsões de fragmentos diminutos e com desvio < 2 mm apresentaram queixa de dor após o tratamento conservador e acabaram sendo submetidos a tratamento cirúrgico posteriormente.


Lesão de Stener


Cerca de
200.000 casos de lesão de ligamento colateral ulnar na metacarpofalangeana do polegar ocorrem por ano. Entretanto, nem todas apresentam retração e interposição da aponeurose do músculo adutor do polegar. Essa é a grande diferença entre o "Polegar do esquiador" e a "Lesão de Stener". No caso da lesão ligamentar aguda, sem interposição tecidual, trata-se de um polegar do esquiador. 


De acordo com Lucerna e Rehman (2023),
as lesões de Stener ocorrem entre 64 a 87% das rupturas completas do ligamento colateral ulnar do polegar. Devido a interposição da aponeurose do músculo adutor do polegar, que age como uma barreira separando as extremidades ligamentares rompidas, o ligamento não consegue cicatrizar corretamente. 


Como Jonathan Tresley
et al. (2017) sintetizaram ao abordar o assunto:


 "
In short, a Stener lesion is UCL [Ulnar Collateral Ligament] that is torn, displaced and entrapped".

Dr Bertil Stener (1920-1999) nasceu em 19 de março de 1920 em uma cidade no interior de Gothenburg, na Suíça. Contribuiu imensamente com a metodologia cirúrgica de tumores ósseos e de partes moles, chegando a permanecer em cirurgias que duravam de 30 a 40 horas. Praticante de tênis, era fluente em inglês, alemão, francês e espanhol. Recebeu inúmeros prêmios e tributos pela sua contribuição médica (Lark et al., 2016).


Sobre a lesão de Stener, há uma passagem emblemática no livro referência de cirurgia de mão (Green's 8th ed) que diz o seguinte: 


"
He [Stener] concluded that without contact at the site of rupture, ligament healing would be impossible and would result in ulnar laxity regardless of the period of immobilization"


Ou seja, por haver um tecido interposto no local onde o ligamento colateral ulnar deveria cicatrizar, poderemos manter o polegar imobilizado o tempo que for e o processo de cicatrização não ocorrerá adequadamente.
Portanto, o tratamento para lesão de Stener é cirúrgico.

Representação da lesão do ligamento colateral ulnar da metacarpofalangeana do polegar e retração do mesmo, com interposição da aponeurose do músculo adutor impedindo que o ligamento cicatrize em sua topografia correta (Lesão de Stener).

Lesão de Stener. Representação esquemática de um polegar DIREITO sendo submetido a um estresse progressivo. A) Relação normal do ligamento colateral ulnar (LCU) coberto pela aponeurose do adutor do polegar. B) Ao ser submetido a um estresse radial (abdução), o ligamento colateral radial (LCR) tem sua tensão reduzida e a aponeurose desliza distalmente, expondo a parte proximal do LCU. C) Com o passar do limite de resistência do LCU, o mesmo rompe em sua inserção (geralmente em sua porção distal). D) Com o reposicionamento da articulação, observa-se a interposição da aponeurose do músculo adutor do polegar. Se o mesmo não for reposicionado cirurgicamente, não haverá cicatrização ligamentar adequada e a articulação permanecerá instável ao estresse lateral (Green's 8th ed).

Outra representação esquemática da lesão de Stener, com o coto do ligamento colateral ulnar retraído proximalmente e interposição da aponeurose do músculo adutor do polegar (Mahajan e Rhemrev, 2013).


Sinais e sintomas da lesão de Stener


Geralmente, os pacientes com a lesão de Stener apresentam alguns sinais e sintomas:

  1. Dor no local do ligamento lesionado
  2. Equimose (mancha arroxeada)
  3. Edema na borda ulnar da articulação metacarpofalangeana


Diagnóstico da lesão de Stener


O exame físico minucioso e comparativo será crucial para o diagnóstico preciso. A maioria dos cirurgiões de mão utiliza um ou mais dos critérios abaixo:

  • > 30° de frouxidão do lado ulnar da articulação metacarpofalangeana quando realizado estresse radial com a articulação EM EXTENSÃO;
  • > 40° de frouxidão quando a articulação EM FLEXÃO;
  • > 15° de frouxidão quando comparado com o polegar contralateral;
  • Ausência de "end point" ao realizar estresse em valgo;


Uma observação anatômica e clínica relevante: o teste em flexão é mais relevante para lesões completas, pois a placa volar provê estabilidade lateral substancial quando a articulação encontra-se em extensão completa.


Radiografias do polegar
(incidências póstero anterior, lateral e oblíqua) devem ser realizadas para descartar fraturas-avulsões ou fraturas condilares. Além disso, na incidência em perfil, se for possível observar uma subluxação volar da falange proximal, pode-se inferir que houve lesão da cápsula articular dorsal ou lesão do tendão extensor. 

Apesar de muito debatido, mantenho a premissa dos autores do Green's (8th ed) de que as radiografias com estresse não se mostraram muito eficazes no diagnóstico e conduta:


"We have not found stress radiographs helpful in the diagnosis or treatment algorithm"


E corroboro com a máxima, em relação a essa lesão:
o diagnóstico da lesão do ligamento colateral ulnar permanece primariamente clínico!


"A diagnosis of a torn UCL [Ulnar Collateral Ligament] remains primarily a clinical diagnosis"


Mais uma vez, essa passagem demonstra a importância da avaliação feita pelo especialista de maneira cautelosa e precisa. 



Exames complementares


Além da radiografia já descrita previamente, o uso da
Ressonância Magnética e da Ultrassonografia receberam grande atenção e valorização no diagnóstico da lesão de Stener, nos últimos anos.


No caso da ressonância, alguns estudos relatam sensibilidade de 96% e especificidade de 95%, mas apresenta maiores custos. Já a ultrassonografia, apresentou acurácia que variou de 81 a 100% em alguns estudos. Mas a grande crítica acerca desse exame é o fato de ser um exame operador dependente (depende da experiência do médico radiologista).


Ao meu ver, o exame acrescenta inúmeras informações mas não substitui o exame físico. Além disso, a maior parte dos pacientes não consegue realizar o exame tão rapidamente por uma série de questões relacionadas aos laboratórios e planos de saúde, o que pode levar a um retardo no diagnóstico e no tratamento. Baskies e Lee (2009) demonstraram que 90% dos pacientes com ruptura completa do LCU tratados com reparo primário dentro de 3 semanas apresentaram resultados bons para excelentes, independente do método de reparo cirúrgico. E a apresentação tardia levava a uma cirurgia maior / mais extensa, com um resultado final pobre.


Tratamento da lesão do LCU


Lucerna e Rehman (2023) descreveram as formas de tratamento baseadas na classificação da lesão:

  • Tipo 1: Rotura parcial ou fratura avulsão minimamente desviada → Imobilização
  • Tipo 2: Rotura do LCU com retração menor que 3 mm → Imobilização
  • Tipo 3: Rotura do LCU com retração maior que 3 mm → Geralmente há falha com a imobilização e a maioria dos pacientes necessitam de reparo cirúrgico
  • Tipo 4: Lesão de Stener → Requer cirurgia em todos os casos


Ao analisar o livro referência de cirurgia de mão (Green's 8th ed), notamos que a lesão completa do ligamento colateral ulnar, mesmo com retração < 3 mm, também possui indicação cirúrgica. O resultado seria mais previsível e a recuperação tenderia a ser mais rápida. Como o autor do capítulo 8 diz: "
Operative intervention is recommended for repair of complete tears as a more predictable and perhaps quicker path to recovery".


Caso seja instituído o tratamento conservador, o tempo de imobilização será de
4 semanas de uso contínuo, seja com tala gessada antebraquiopalmar envolvendo o polegar, seja com órtese. A intenção é imobilizar a articulação metacarpofalangeana e manter a interfalangeana livre.


Após esse período, é recomendado o uso adicional de órtese por mais 2 semanas, enquanto se introduz os exercícios de reabilitação. 

É recomendado evitar atividades intensas que envolvam o uso do polegar ao longo dos próximos 3 meses após a lesão.


Uma observação importante feita pelo Dr. Jeffrey Yao e que corroboro com minha experiência clínica é de que é muito comum o paciente referir dor na região ulnar da articulação metacarpofalangeana por 6 meses ou mais após a lesão, mesmo não havendo instabilidade no exame físico.


"
It is common for patients to have a degree of aching pain on the ulnar side of the MP joint for 6 or more months after the injury despite having no laxity on examination" (Jeffrey Yao, M.D.).

Órtese de plástico termomoldável feita sob medida para imobilização da articulação metacarpofalangeana.


Cirurgia para Lesão de Stener


A técnica a ser utilizada para reparo do ligamento colateral ulnar depende, em parte, do local onde a lesão ocorreu, no ligamento. Lesões intrasubstanciais são menos comuns e historicamente têm sido tratadas com sutura direta do ligamento, com ou sem tecido autólogo. O local mais comum de lesão é a avulsão distal da base da falange proximal, havendo indicação de reposicionamento e fixação do ligamento até sua inserção óssea utilizando variadas técnicas, que incluem
sutura tipo "pull-out" ou âncoras ósseas.


Será realizada uma incisão linear ou do tipo "
Lazy S" para exposição da lesão, proteção dos ramos superficiais do nervo radial e abertura da aponeurose do músculo adutor do polegar. A articulação será inspecionada em busca de fragmentos articulares ou cartilaginosos e os mesmos deverão ser removidos, se soltos.


Após reinserção ou reparo ligamentar, deve-se realizar um estresse radial na articulação metacarpofalangeana para testar a estabilidade do reparo. Se estável, a cápsula dorsoulnar deve ser aproximada e a aponeurose do adutor, suturada. 


Uma outra técnica de tratamento inclui o uso de uma
fibra sintética para aumentar a força de resistência do reparo, chamada de técnica "Internal brace". Geralmente, é utilizado uma fita não absorvível de 1.5 mm além de duas âncoras com características peculiares descritas como "Pitchfork-shaped suture anchors", que são inseridas na base da falange proximal e no colo do metacarpo, nos pontos de origem e inserção do LCU. A vantagem dessa técnica é o aumento da estabilidade imediata, permitindo reabilitação precoce (dentro de 1 semana do pós operatório). Apesar de inúmeros cirurgiões de mão terem adotado tal estratégia com entusiasmo e bons resultados no curto prazo, vale ressaltar que nenhum estudo clínico já foi publicado analisando sua eficácia e potenciais complicações.

Passos cirúrgicas para reinserção do ligamento colateral ulnar, na lesão de Stener. 1) Abdução da falange para máxima visualização da articulação (como um livro aberto). Nesse momento será realizada irrigação articular com soro fisiológico e a busca por lesões associadas. 2) Identificação do sítio de inserção do ligamento colateral, também chamado de "footprint". Deverá ser realizada uma perfuração para introdução da âncora, se atentando para inserção mais volar para prevenção de subluxação rotatória da articulação. 3) Inserção da âncora, que pode ser flexível ou metálica. 4) Utilização das âncoras para posicionamento da porção avulsionada do ligamento.


Expectativas pós operatórias


A reabilitação deve ser precoce, sob orientação e cuidados de um fisioterapeuta ou terapeuta ocupacional. Características comuns pós operatórias incluem:

  • Desconforto vago e maior sensibilidade na borda ulnar da articulação que pode persistir por até 1 ano;
  • Recuperação da amplitude de movimento do polegar de 80 a 90% comparado ao lado não lesionado (na articulação metacarpofalangeana)
  • Recuperação completa dos movimentos da interfalangeana do polegar, na maior partes dos casos;
  • Discreta perda de força de preensão palmar e movimento de pinça, com comprometimento de 5 a 10%;
  • Liberação completa para atividades cotidianas com 3 meses da cirurgia;
  • Esportes de contato costumam ser liberados a partir do 4° mês da cirurgia;
  • Desmame da órtese entre a 6ª e 10ª semana de pós operatório.


Complicações da lesão de Stener


A apresentação tardia e diagnóstico retardado da lesão de Stener influencia de modo direto nos resultados clínicos e retarda o retorno às atividades do paciente. Caso não seja diagnosticada ou não seja tratada adequadamente, a lesão de Stener pode levar a: 

  1. Dor crônica no polegar
  2. Instabilidade articular
  3. Osteoartrite / osteoartrose
  4. Neuropraxia do nervo sensitivo radial
  5. Instabilidade recorrente
  6. Rigidez da interfalangeana e metacarpofalangeana após a cirurgia


Polegar de Gamekeeper


O termo "
Gamekeeper's thumb" (polegar do encarregado da caça) foi utilizado pela primeira vez em 1955, por CS Campbell, cirurgião ortopedista que identificou uma lesão ocupacional nos polegares de encarregados de caça escoceses. Eles sacrificavam coelhos caçados realizando um movimento de estrangulamento utilizando o polegar e dedo indicador, com estresse em valgo de forma repetitiva. Essa lesão contínua levava a uma instabilidade crônica na articulação metacarpofalangeana (Hung et al., 2023).

Imagem história evidenciando o mecanismo de trauma no polegar dos encarregados de caça escoceses ("Gamekeeper's thumb") que levava a uma lesão crônica do ligamento colateral ulnar na metacarpofalangeana do polegar.



Atualmente, as causas de instabilidade crônica do ligamento colateral ulnar (LCU) incluem:

  1. Lesão aguda de LCU não tratada
  2. Falha no reconhecimento da lesão de Stener
  3. Atenuação progressiva do ligamento


O paciente com instabilidade crônica apresenta queixa de
dor, edema e sensação de fraqueza ao utilizar o polegar. A dor e sensação de instabilidade tende a ser exacerbada ao realizar movimento de pinça, carga com mecanismo torcional (como abrir tampas de garrafas ou frascos) ou ao segurar objetos maiores como garrafas.

Tipos de esforços prejudicados quando o paciente apresenta lesão do ligamento colateral ulnar, muitas vezes com o paciente referindo queda do objeto devido a sensação de instabilidade.

O exame físico dos pacientes com instabilidade crônica do LCU é similar ao dos pacientes com lesão aguda, entretanto, é considerado menos desafiador, principalmente porque o paciente apresenta menor intensidade de dor durante os testes e a instabilidade costuma ser muito mais evidente.

Estresse em valgo no polegar normal (polegar esquerdo) e no lado lesionado (polegar direito). Observe a instabilidade grosseira na articulação metacarpofalangeana e ausência de "end point".Parágrafo Novo


Dentre as opções de tratamento, estão o reparo utilizando tecidos remanescentes locais, reconstrução com enxerto de tendão autólogo, "internal brace" ou fusão articular (artrodese metacarpofalangeana), a depender da presença de doença degenerativa. Cabe ao cirurgião de mão decidir qual estratégia cirúrgica será utilizada, assim como qual enxerto será utilizado (palmar longo, extensor próprio do indicador, flexor radial do carpo, extensor radial longo do carpo, extensor do dedo mínimo, extensor longo do hálux ou abdutor longo do polegar).


Expectativas pós operatórias


Tipicamente, a estabilidade do polegar é recuperada após a reconstrução ligamentar. Entretanto, Glickel (2002) fez algumas considerações relevantes que devem ser ressaltadas antes de se propor a reconstrução ligamentar ao paciente:

  1. 2/3 dos pacientes não costumam apresentar dor no pós-operatório e 1/3 apresenta uma queixa de dor leve e ocasional;
  2. Aproximadamente 80% do movimento da articulação metacarpofalangeana é recuperada, assim como mais de 90% da interfalangeana;
  3. Perda discreta de força de pinça e sensação de fraqueza no polegar.


E o próprio autor menciona que a satisfação geral dos pacientes é alta:

"The overall satisfaction rate among patients who have had the procedure is high".


CONCLUSÃO


A lesão do ligamento colateral ulnar da articulação metacarpofalangeana do polegar deve ser diagnosticada precocemente e conduzida de maneira apropriada, ou as sequelas funcionais poderão ser catastróficas. 


Considerando que o diagnóstico é clínico, a avaliação imediata feita por um cirurgião de mão capacitado será decisiva para o manejo correto. Quando indicada a cirurgia, a opção pelas formas de tratamento deverá ser esclarecida e decidida em conjunto com o paciente. Por isso, consulte seu especialista de cirurgia de mão para o diagnóstico preciso e conduta acertada.


Referências bibliográficas

  1. Wolfe SW, Hotchkiss RN, Pederson WC, Kozin SH, Cohen MS, Green's Operative Hand Surgery, 8th ed. Elsevier, 2022
  2. Lucerna A, Rehman UH. Stener Lesion. [Updated 2023 Jun 12]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK541004/
  3. Lark ME, Maroukis BL, Chung KC. The Stener Lesion: Historical Perspective and Evolution of Diagnostic Criteria. Hand (N Y). 2017 May;12(3):283-289. doi: 10.1177/1558944716661999. Epub 2016 Jul 28. PMID: 28453338; PMCID: PMC5480664.
  4. Mahajan M, Rhemrev SJ. Rupture of the ulnar collateral ligament of the thumb - a review. Int J Emerg Med. 2013 Aug 12;6(1):31. doi: 10.1186/1865-1380-6-31. PMID: 23938194; PMCID: PMC3765347.
  5. https://surgeryreference.aofoundation.org/orthopedic-trauma/adult-trauma
  6. Baskies MA, Lee SK. Evaluation and treatment of injuries of the ulnar collateral ligament of the thumb metacarpophalangeal joint. Bull NYU Hosp Jt Dis. 2009;67(1):68-74. PMID: 19302060.
  7. Hung CY, Varacallo M, Chang KV. Gamekeeper's Thumb. [Updated 2023 Aug 7]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK499971/
  8. Glickel SZ. Thumb metacarpophalangeal joint ulnar collateral ligament reconstruction using a tendon graft. Tech Hand Up Extrem Surg. 2002 Sep;6(3):133-9. doi: 10.1097/00130911-200209000-00006. PMID: 16520611.

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